A Noite Devorou o Mundo de Pit Agarmen

É muito simples pegar esse livro e dizer que é mais uma história sobre apocalipse zumbi. Não desmerecendo o gênero, sou fã e já li alguns livros sobre o assunto, mas esse livro atingiu o público que esta “fora da curva” nesse gênero.

O livro foi lançado no Brasil em 2014 pelo autor Pit Agarmen, pseudônimo do autor Martin Page. Eu já li alguns outros livros dele e peguei esse de troca no skoob quando lançou, mas só agora resolvi sentar a bundinha e passar algumas horas em companhia desse personagem.

O protagonista relata através de entradas (como se fosse um diário) como é a sua vida de sobrevivente depois de um apocalipse zumbi. Ele acorda de ressaca na casa de uma amiga e percebe que o mundo tá um caos e que aqueles filmes de ficções do Romero, por algum motivo, tá acontecendo na vida real.

Mas o foco não é os zumbis. Essa narrativa é um relato sobre a solidão, sendo ela tão profunda que até o toque nessas criaturas repulsivas em algum momento se torna desejável por ser uma ligação física com um ser, mesmo que não seja vivo por definição.

O autor faz o relato de uma situação teoricamente inconcebível, porém parece próxima para quem pelo menos uma vez já se sentiu sozinho nesse mundão. Só que a diferença é que ele realmente tá bem só no meio de Paris e sem água quente e banhos quentes são partes essenciais para a cura da tristeza.

A minha única ressalva com esse livro é que ele é muito curto. São aproximadamente 200 páginas de solidão, mas eu acompanharia esse personagem por mais um bom tempo.

Em alguns pontos a ambientação da narrativa me lembrou Ensaio Sobre a Cegueira e a epigrafe do livro é um trecho do Fernando Pessoa que diz “Somos dois abismos frente a frente” e nos agradecimento o autor diz que esse livro não seria possível sem a existência do The Last Man da Mary Shelley. É satisfatório e prazeroso ler um autor contemporâneo e perceber suas referências em autores que também admiro.

Gosto de como a melancolia e a solidão reúne alguns dos meus livros preferidos, sendo um deles outro do mesmo autor chamado A Libélula dos Seus Oito Anos. Ainda não sei se esse entrará para essa lista também porque os meus favoritos se formam com o tempo e com a memória que trago da leitura, mas já posso dizer  que esse quase ensaio sobre a solidão é uma leitura das boas e que já recomendo.

A Noite Devorou O Mundo de Pit Agarmen traduzido por  Carlos Nougué foi publicado em 2014 pela Editora Rocco.

Coletânea de álbuns escutados – Julho 2017

2017 será conhecido como o ano em que eu posso resumir a minha vida em listas e entre elas está a minha lista de álbuns ouvidos. Nesse mês de julho os que eu ouvi foram os seguintes:

Either/Or do Elliot Smith (1997) – certa madrugada eu estava escutando a trilha sonora de A Primeira Noite de Um Homem e quando acabou o Spotify colocou Speed Trials e eu gostei muito e percebi que nunca dei uma chance para amar Elliot Smith, criador de uma das minhas músicas preferidas da vida (Needle in the Rye) então comecei a descobrir a sua discografia com esse disco que é excelente do começo ao fim.

Música preferida: Between the Bars

Are We There de Sharon Van Etten (2014) – não foi a primeira vez que ouvi esse álbum, eu já tinha escutado a Sharon aleatoriamente e achado lindo esse visual retrô dela, mas depois que ela apareceu na temporada de Twin Peaks cantando Tarifa eu fiquei meio obcecada.

Música preferida: Tarifa e Your Love is Killing Me

I’m Okay de The Shoe (2014) – Jena Malone cantando canções de amor. Só isso deveria se o suficiente para escutar essa dupla. A minha música preferida aparece no filme Lovesong que está na Netflix e falei um poquinho dele nessa cartinha.

Música preferida: Broken Hearted Love Song

Tourist History de Two Door Cinema Club (2013) – eu lembro de quando esse álbum saiu, eu lembro de quando Two Door Cinema Club foi anunciado para o Lolla e eu lembro de quando eu não fui e fiquei em casa vendo os shows pela TV. Acontece, não é? Eu estava com saudades de 2013 e ao ouvir esse álbum eu consigo até sentir o sol de fim da tarde na minha pele da época em que passava a maioria dos dias em casa lendo e ouvindo música.

Música preferida: toda a sequência do começo do álbum até o final de I Can Talk

landmark de Hippo Campus (2017) – o clima desse álbum é tão two door cinema club/2013 e tão indie fofo que eu só posso amar. Descobri a banda Your Favorite New Artists Of 2017 (So Far) do podcast All Songs Considered.

Música preferida: “Sometimes I call it tuesday sometimes I call it the best day of my life” tuesday

Everything Now de Arcade Fire (2017) – Arcade Fire é  a minha banda favorita e o dia em que sua banda favorita lança um álbum novo com certeza é um bom dia. Não foi um álbum muito bem aceito pela crítica, mas eu vejo pontos negativos e pontos positivos e (no geral) curti.

Rank de todas as música do Arcade Fire da pior para a melhor.

Músicas preferidas: Put your money on me e we dont deserve love

Lust For Life da Lana Del Rey (2017) – uns anos atrás eu tentei ouvir Lana e achei péssimo, mas de tanto falarem desse álbum eu resolvi despretensiosamente ouvir e agora estou apaixonada. Que obra linda! Parece pura emoção para mexer ali no fundo do meu coração e agora terei que ouvir tudo dessa mulher.

Músicas preferidas: toda a sequência de God Bless America o fim de Tomorrow Never Came

I See You de The XX (2017) – Spotify tocou Say Something Loving depois do álbum da Lana e lá vou eu ouvir outra banda que eu não tinha gostado e tô admirada com a beleza que é esse álbum. Fazem apenas 5 dias que estou escutando ele e não conheço mais nada de The XX.

Música preferida: Say Something Loving

The Leftovers – Convivendo com a ausência

O meu vô era uma pessoa muito religiosa. Quando ele descobriu que estava com câncer ela via como se fosse um teste de fé. Eu tinha 14 anos, mas já não tinha tanta fé como o esperado e o pouquinho que restava foi embora quando encarei a primeira morte de alguém querido.

Mas os meses antes do meu vô falecer foi uma época divertida e de conhecimento. Morávamos na mesma casa sendo que ele se mudou para lá no mês de julho, no primeiro dia de férias. Tivemos quase um ano que entre sessões de quimioterapia assistíamos filmes, comíamos pastel de palmito e ele me dava broncas porque eu era só uma criança e não deveria sair por aí “namorando”.

Um dos filmes que assistímos em um sábado foi “Deixados para trás” que parte do princípio que pessoas foram arrebatadas, simplesmente algumas foram escolhidas por deus e outras ficaram na terra. Lembro de ter gostado do filme, mas ele se tornou muito religioso para a Stephany pós morte do avô que é um pouco mais cética.

Quando li sobre The Leftovers achei que poderia ser religiosa como o filme e perdia o interesse. A série produzida pela HBO chegou ao final uns meses atrás e foi altamente elogiada pela crítica, então, apesar desse receio eu resolvi dar uma chance.

A série começa perto do aniversário de três anos da “Partida Repentina” acontecimento em que 2% de toda a população simplesmente desapareceu. Na primeira temporada vemos como o mundo lida com esse evento. Como que a ciência pode explicar esse acontecimento? Seria um ato divino? Será que pode acontecer de novo? Como as novelas e filmes continuaram sendo que alguns atores sumiram? Como a sociedade se organiza depois de um acontecimento inexplicável como esse?

Uns tentam seguir em frente, outros ignoram e tentam esquecer, mas é definitivamente um acontecimento que mudou a vida de todo mundo e surgem seitas para lidar com essa melancolia profunda de inúmeras maneiras, de certa forma todos ali procuram uma forma para aliviar a dor ou o medo.

Uma das seitas que acompanhamos de perto é totalmente niilista e mostra que depois desse acontecimento nada importa, a vida não faz mais sentido, não há um proposto, não há mais família e o que resta é lembrar daquele acontecimento tão horroroso para a humanidade sendo um incomodo para a sociedade. Todos eles se vestem de branco, não falam, fumam e ficam na frente das casas das pessoas ou em lugares públicos para serem um lembrete vivo do acontecimento.

Quando alguém morre passamos pelo luto e de certa forma, temos que aceitar que é parte da vida, mas quando algo some do nada não há um manual de instrução para lidar com isso. Uma outra seita diz que pode tirar toda a sua dor com um abraço, e claro, isso custa muito caro mas as pessoas pagam porque não há consolação e se algo pode remotamente dá certo vale a pena tentar.

Uma das grandes discussões nas 3 temporadas é sobre fé. Em certa parte há um interlúdio em que alguns religiosos acreditavam na volta de Jesus Cristo em certa data e com tanta certeza eles sobem nos telhados de suas casas e ali aguardam pelo grande espetáculo do fim do mundo. É frustrante quando isso não acontece, ainda mais quando isso se repete e demonstra como isso pode ser uma instituição falha e que nem a maior fé do mundo é capaz de fazer o mundo acabar, porém isso pode gerar um medo com consequências reais.

Em alguns momentos parece uma questão de quem conta a melhor história. Um dos pontos que me chamou a atenção para a série foi ler que ela quebra algumas “leis” de narrativa. É comum e bem básico dizer que é melhor mostrar do que apenas dizer, porque assim você evidência para o expectador o que aconteceu. The Leftovers quebra essa regra em vários momentos para ver até que ponto aqueles personagens te conquistaram para você acreditar neles. Em vários momentos tudo que temos é a palavra de alguém e a escolha de acreditar ou não.

Quando eu terminei a terceira temporada eu fiquei um pouco desolada/triste mas feliz e satisfeita com o que me foi apresentado. Fiquei um pouco ansiosa também e meu corpo falava que eu precisava escrever sobre isso, mas outra parte de mim diz que eu só preciso sentir mesmo, porque a história contada nessas 3 temporadas é  muito sobre experienciar a ausência, sobre lidar com sentimentos sendo que o ideal é fazer nada e tentar aceitar aquilo que aconteceu. É uma história (quase) sem vilões personificados, o que contrapõe e coloca o caráter dos personagens a prova é essa situação sem explicação e esse imenso sentimento de solidão.

Esses dias eu estava conversando com a minha prima sobre como é difícil nos acostumarmos com a ausência, pode ser de uma pessoa, de um habito ou até pessoas que precisam viver sem partes do corpo e como o cérebro não lida com isso de uma forma simples. Eu contei pra ela que depois que o meu vô morreu em uma conversa eu disse que o meu vô morava na mesma casa que eu e que eramos uma grande família de 7 pessoas em uma casa com dois quartos. Naquele momento tudo parecia tão normal que eu simplesmente esqueci que o meu vô tinha morrido e quando lembrei revivi a ausência de uma forma diferente pois junto dela estava o esquecimento.

[Coisas terríveis aconteceram nesse mundo e o nosso único conforto é que nós não as causamos – tradução livre]

Lá em cima eu falei que um dos meus receios com a série era que ela poderia ser muito religiosa. Pois bem, eu não estava errada pois ela lida muito com a espiritualidade, mas critica a religião e isso de colocar “fé” em rótulos. Ela lida com acontecimentos extraordinários com pessoas céticas e como elas vão lidar com isso e até que ponto elas podem aceitar, até que ponto elas podem mudar o que são porque o mundo tá uma bagunça.

E eu que achava que crescer é cair da árvore

Esse texto foi publicado originalmente na minha newsletter aqui.

Eu tinha uma visão que amadurecer era meio que ficar podre e cair da árvore. Relutei tanto para deixar de ser criança, e mais ainda de ser adolescente tanto que isso ainda é um trabalho em andamento e confesso que tem dias que a minha vontade é de chorar e ficar em um canto porque não tô afim de aceitar essas responsabilidades.

Hoje não é um deles, ao contrário disso eu reavalio as minhas decisões e novamente percebo que amadurecer/crescer é preciso (como necessidade) mas impreciso pra caramba (em todas as outras possibilidades), porque não tem um manual e nem todos os ensinamentos da minha mãe, da minha vó e de toda a internet me diz exatamente o que fazer.

Ainda bem que existe a arte e comunicação. Através de series, músicas, livros e toda essa rede que tá por aqui sinto que compartilhamos momentos, sentimentos e isso me ajuda todos os dias.

Ao contrário do que geralmente vejo um pessoal mais próximo falando eu me identifico muito com Girls, demoraram algumas temporadas e vários episódios bizarros para perceber que nem sempre essa identificação é positiva.

Super legal ver alguém tomando uma atitude parecida com a sua porém, muito dolorido ver que cedo ou tarde ela ouviu ou foi evidenciado que o que ela fez foi egoísta, muito egoísta e até errado mesmo. Consequentemente isso também se encaixa pra mim, para as minha decisões, a minha história.

Girls é uma série sobre amadurecimento, mas em algumas temporadas nem parecia tanto sobre isso. Ela é também sobre criatividade, sobre todo aquele sentimento e momentos que parecem inúteis mas que na verdade são cheios de significados exatamente por causa da sua simplicidade. Uma série que é preciso construir certa intimidada, ali cria se uma conexão que faz sentido para ela e nós que compartilhamos esses momentos ou essas sensações. É sobre se divertir inconsequentemente (para essa questão especifica deixo o link de um dos momentos mais divertidos, um dos melhores episódios, da serie aqui);

É sobre amar, desamar e depois querer de novo porque a maioria das decisões são feitas a partir de um impulso

e o que elas buscam é auto satisfação um bem estar que está muito além de realização profissional, um namorado ou um destino. É a busca por aquele futuro promissor, ser aquele adulto radiante, sem problemas então um dos choques é perceber que ninguém tá tão bem assim, nem os pais, nem os artistas que parecem bem sucedidos, nem o cara que é todo bonitão. Essa felicidade é algo instável, então toda essa busca por ela é uma bagunça.

Teoricamente a minha idade não se encaixa com a das personagens, tenho 23 anos e acho que essa é a idade (aproximadamente) em que no piloto a Hannah escuta dos seus pais que eles não vão mais ajuda-la financeiramente e que tá mais do que na hora dela se virar. Sempre achei que se eu escutasse isso da minha mãe eu piraria, mas a verdade é que hoje eu tô vendo isso como um caminho natural, a minha dificuldade está em colher os frutos que não plantei no passado, mas meu otimismo diz que ainda da tempo de me encontrar no mundo, de tirar habilitação, de encontrar vitalidade para juntar dinheiro, para me organizar e criar uma vida só minha. Seguimos animadas, mas amedrontadas também porque eu sou meio cara de pau e digo que a vida tá me obrigando a virar adulta sem aviso prévio, afinal o que eu queria era uma vida estável (e assim estava) e pra mim não fazia sentido ela mudar, mas isso é isso aí.

Esse texto tá cheio de metáforas obvias com frutos, árvores e colheitas, mas foi assim que eu percebi que amadurecer não tem na a ver com apodrecer.

Não sei se é uma boa ser tão sensível em relações a artes. O episódio acabou, mas todo o meu ser tá ligado á aqueles acontecimentos e me bate uma porção de sentimentos e uma necessidade de fazer a minha vida acontecer com mais intensidade. Quando terminei Mad Men sai de casa meio que sem destino e fui parar na paulista em um dia chuvoso. Ali fiquei horas só observando o movimento das pessoas, aquela porção enorme de seres humanos indo pra lá e pra cá e eu ali pensando em Donald Draper e Peggy Olson. Foi um dia importante, não só porque eu terminei uma série espetacular, mas por causa dela eu tive que repensar minhas (não) escolhas profissionais, a velocidade da vida e mais vários assuntos que passaram na minha cabeça durante um tempo de ócio, mas muito útil.

Girls ficou na minha cabeça toda essa madrugada, foram horas que seriam dedicadas a sono não dormidas e quando o sono realmente veio ele foi conturbado e com um dos sonhos mais diretos da minha vida. Meu vô veio falar pra mim que ele estava assistindo Peter Pan com as irmãs dele, mas que fez uma pausa para ir no chá da tarde do céu porque ele sabia que estava na hora dele desejar certas coisas pra mim e que é para eu ficar calma que isso dará certo. Ele sorriu e eu acordei chorando, um misto de saudade e emoção por escutar a sua voz tão bonita e nítida novamente.

Eu não sei onde fica o meu botãzinho de ligar e desligar emoções quando se trata de filmes, series e livros, mas cada noite não dormida por consequência disso vale a pena porque parece uma experiência expandida que nenhuma transmídia é capaz de me proporcionar. É uma reafirmação de sentimentos que vou levar comigo e momentos importantes para a minha formação.

Cada vez que retomo esses assuntos com alguém ou com os meus pensamentos percebo que é algo sem fim e se dependesse de mim ficaria horas só falando sobre estar com pessoas, sentir os seus sentimentos e do próximo e sobre como certas coisas são questão de tempo e perspectiva. Em um trecho da última temporada de Mozart in the Jungle dois personagens conversam sobre as diferenças entre ser regido por um maestro ou outro e tudo se resume a como aquele percebe o tempo e te transmite. São compassos e momentos que podem ser mais rápidos ou mais lentos. Música me parece muito complexa por causa disso mesmo, é um trabalho que lida diretamente com o moldar do tempo, mas a arte em geral pode fazer isso quando você percebe a diferença da leitura em narrativas que fluem ou que são mais pesadas.

Sendo assim o fruto amadurecer não é uma questão de ficar podre e cair de árvore, é desabrochar e saber que o tempo te trará milhões de sensações e que talvez cair seja uma delas, mas que você vai acabar seguindo em frente porque é a única opção.

Dear Evan Hansen e porque falar sobre solidão e suicídio é importante

Have you ever felt like nobody was there?
Have you ever felt forgotten in the middle of nowhere?
Have you ever felt like you could disappear?
Like you could fall, and no one would hear?

You Will Be Found — Benj Pasek and Justin Paul

Solidão é um sentimento que todo mundo já experienciou, eu poderia começar esse texto falando das vezes que almoçamos sozinhos ou quando não tem ninguém em casa e você precisa levantar para atender ao telefone porque é você ou já era, mas esse tipo de solidão é quase superficial comparada com a falta de alguém para se abrir e conversar. Certa vez li em uma agendinha que se você tem um amigo, apenas um amigo em qualquer lugar do mundo, tem tudo porque há em algum lugar alguém para te ouvir.

Dear Evan Hansen é um musical que consegue falar sobre esse sentimento de uma forma carismática. Através das músicas acompanhamos um pouco da vida do Evan (Ben Platt) a partir do primeiro dia de aula no seu senior year (equivalente ao último ano do ensino médio) e o único desejo da sua mãe é que ele faça amigos e seja otimista que será um bom ano. Sua vida muda quando um colega de escola se suicida e os pais dele encontram uma carta supostamente direcionada a Evan.

No começo do ensaio O Mito de Sísifo de Albert Camus ele diz: “só existe um problema filosófico realmente sério: o suicídio. Julgar se a vida vale ou não a pena ser vivida é responder a pergunta fundamental da filosofia”. No musical não sabemos exato o motivo que levou Connor (Mike Faist) a isso, durante as músicas é citado algumas causas possíveis como solidão e abuso de drogas.

Falar sobre suicido é trazer a tona como lidamos com a vida, morte, solidão e relacionamentos. É um ato que comove toda uma família e comunidade porque é algo brusco e não temos uma cartilha que explica como devemos reagir. A música Requiem mostra um pouco dos sentimentos de Zoe (Laura Dreyfuss) irmã de Connor e os seus pais em relação à morte do irmão/filho e por mais que a reação dela não seja a esperada, o importante é que o suicídio alterou toda a rotina familiar.

Muitos motivos podem levar as pessoas a tirarem suas vidas, o grande foco do musical é relatar um pouco da solidão, ainda mais quando estamos nesse período de transição de crianças para adultos. É importante mostrar que existe meios de combater esse sentimento como amigos, família, folhas de papel em que você pode escrever o seus sentimentos e até instituições que estão dispostas a te ouvir.

I try to speak, but nobody can hear
So I wait around for an answer to appear
While I’m watch, watch, watching people pass
I’m waving through a window, oh
Can anybody see, is anybody waving back at me?

Waving Through a Window — Benj Pasek and Justin Paul

Steven Levenson é o responsável pela criação dessa narrativa e um dos pontos interessantes é como situações podem unir pessoas que eram anteriormente estranhas. Ele também mostra que podemos compartilhar nossa vida em redes sociais e supostamente nos sentirmos parte de algo, porém essas experiências podem ser distantes e sem muitos vínculos pessoais e isso é tratado através de alguns elementos narrativos:

  • As fotos do palco mostram vários telões digitais cheias de informações para representar a importância da vida virtual contrastando com músicas inteiras cantadas por um só personagem.

  • As músicas tem grandes solos e os momentos em que toda companhia canta é bem especifico sendo eles quando os personagens sentem-se acolhidos. Esse é um dos pontos principais do musical: mostrar que não estamos sós.

Ouvir Dear Evan Hansen é como um abraço para reconfortar a nossa solidão, é meio difícil não se identificar com alguns trechos ou não sentir empatia pela situação. Mesmo sendo um drama as músicas não são necessariamente tristes, ao contrário disso reparamos que os arranjos são animados e as letras com piadinhas pertinentes que deixam a experiência de acompanhar essa estória mais confortável.(disponível no Spotify e YouTube).

CURIOSIDADES

Gostou de La La Land? Justin Paul e Benj Pesek são creditados como letristas das canções do filme também são responsáveis pelas letras do musical. Marc Platt que é um dos produtores do longa e um dos produtores do musical, além de ser pai do Ben Platt que tem o papel principal em Dear Evan Hansen.

A peça é orquestrada por Alex Lacamoire, ele é um dos responsáveis pela parte musical de Hamilton (também conhecido com o right hand man do Lin Manuel-Miranda), no programa de Dear Evan Hansen ele é creditado como: Music Supervision, Orchestration and adictional arrenge.

No programa do musical tem a indicação de 3 instituições que trabalham com essa situação de crises, depressão e suicídio sendo elas:

No Brasil temos o CVV (Centro de Valorização da Vida) que fornece suporte emocional atendendo quem quer conversar através de ligação, email, chat, etc.

LINKS

. Programa Dear Evan Hansen

. Dear Evan Hansen [Original Broadway Cast Recording]

Waving Through a Window performance ao vivo

Only Us

Painel na BroadwayCon 2017

Por que precisamos falar sobre o suicídio de jovens no Brasil (texto no jornal Nexo)

SIMILARES

Dear Evan Hansen tem um clima que me lembra:

  • Apanhador no Campo de Centeio (livro) — Holden é um adolescente muito só e isso fica evidente nas “aventuras” que ele relata no livro.
  • As Vantagens de Ser Invisível (livro e filme) — mostra como é bom ter amigos, em ambas temos personagens que colocam os seus sentimentos em cartas.
  • Skins (série) — acompanha vários adolescentes sendo que eles pertencem ao mesmo grupo de amigos, mas isso não impede que se sintam sozinhos. Durante as temporadas eles precisam lidar com a morte, doença e situações extremas.
  • Ensina-me a Viver (peça e filme)— um filme que também tem uma amizade peculiar e um relacionamento um pouco esquisito com a morte.
  • Elena (filme) — nesse documentário poético temos Petra Costa (diretora do filme) investigando as suas memórias e dos seus familiares depois de muitos anos do suicídio da sua irmã.