Esse texto foi publicado originalmente na minha newsletter aqui.
Eu tinha uma visão que amadurecer era meio que ficar podre e cair da árvore. Relutei tanto para deixar de ser criança, e mais ainda de ser adolescente tanto que isso ainda é um trabalho em andamento e confesso que tem dias que a minha vontade é de chorar e ficar em um canto porque não tô afim de aceitar essas responsabilidades.
Hoje não é um deles, ao contrário disso eu reavalio as minhas decisões e novamente percebo que amadurecer/crescer é preciso (como necessidade) mas impreciso pra caramba (em todas as outras possibilidades), porque não tem um manual e nem todos os ensinamentos da minha mãe, da minha vó e de toda a internet me diz exatamente o que fazer.
Ainda bem que existe a arte e comunicação. Através de series, músicas, livros e toda essa rede que tá por aqui sinto que compartilhamos momentos, sentimentos e isso me ajuda todos os dias.
Ao contrário do que geralmente vejo um pessoal mais próximo falando eu me identifico muito com Girls, demoraram algumas temporadas e vários episódios bizarros para perceber que nem sempre essa identificação é positiva.
Super legal ver alguém tomando uma atitude parecida com a sua porém, muito dolorido ver que cedo ou tarde ela ouviu ou foi evidenciado que o que ela fez foi egoísta, muito egoísta e até errado mesmo. Consequentemente isso também se encaixa pra mim, para as minha decisões, a minha história.
Girls é uma série sobre amadurecimento, mas em algumas temporadas nem parecia tanto sobre isso. Ela é também sobre criatividade, sobre todo aquele sentimento e momentos que parecem inúteis mas que na verdade são cheios de significados exatamente por causa da sua simplicidade. Uma série que é preciso construir certa intimidada, ali cria se uma conexão que faz sentido para ela e nós que compartilhamos esses momentos ou essas sensações. É sobre se divertir inconsequentemente (para essa questão especifica deixo o link de um dos momentos mais divertidos, um dos melhores episódios, da serie aqui);
É sobre amar, desamar e depois querer de novo porque a maioria das decisões são feitas a partir de um impulso
e o que elas buscam é auto satisfação um bem estar que está muito além de realização profissional, um namorado ou um destino. É a busca por aquele futuro promissor, ser aquele adulto radiante, sem problemas então um dos choques é perceber que ninguém tá tão bem assim, nem os pais, nem os artistas que parecem bem sucedidos, nem o cara que é todo bonitão. Essa felicidade é algo instável, então toda essa busca por ela é uma bagunça.
Teoricamente a minha idade não se encaixa com a das personagens, tenho 23 anos e acho que essa é a idade (aproximadamente) em que no piloto a Hannah escuta dos seus pais que eles não vão mais ajuda-la financeiramente e que tá mais do que na hora dela se virar. Sempre achei que se eu escutasse isso da minha mãe eu piraria, mas a verdade é que hoje eu tô vendo isso como um caminho natural, a minha dificuldade está em colher os frutos que não plantei no passado, mas meu otimismo diz que ainda da tempo de me encontrar no mundo, de tirar habilitação, de encontrar vitalidade para juntar dinheiro, para me organizar e criar uma vida só minha. Seguimos animadas, mas amedrontadas também porque eu sou meio cara de pau e digo que a vida tá me obrigando a virar adulta sem aviso prévio, afinal o que eu queria era uma vida estável (e assim estava) e pra mim não fazia sentido ela mudar, mas isso é isso aí.
Esse texto tá cheio de metáforas obvias com frutos, árvores e colheitas, mas foi assim que eu percebi que amadurecer não tem na a ver com apodrecer.
Não sei se é uma boa ser tão sensível em relações a artes. O episódio acabou, mas todo o meu ser tá ligado á aqueles acontecimentos e me bate uma porção de sentimentos e uma necessidade de fazer a minha vida acontecer com mais intensidade. Quando terminei Mad Men sai de casa meio que sem destino e fui parar na paulista em um dia chuvoso. Ali fiquei horas só observando o movimento das pessoas, aquela porção enorme de seres humanos indo pra lá e pra cá e eu ali pensando em Donald Draper e Peggy Olson. Foi um dia importante, não só porque eu terminei uma série espetacular, mas por causa dela eu tive que repensar minhas (não) escolhas profissionais, a velocidade da vida e mais vários assuntos que passaram na minha cabeça durante um tempo de ócio, mas muito útil.
Girls ficou na minha cabeça toda essa madrugada, foram horas que seriam dedicadas a sono não dormidas e quando o sono realmente veio ele foi conturbado e com um dos sonhos mais diretos da minha vida. Meu vô veio falar pra mim que ele estava assistindo Peter Pan com as irmãs dele, mas que fez uma pausa para ir no chá da tarde do céu porque ele sabia que estava na hora dele desejar certas coisas pra mim e que é para eu ficar calma que isso dará certo. Ele sorriu e eu acordei chorando, um misto de saudade e emoção por escutar a sua voz tão bonita e nítida novamente.
Eu não sei onde fica o meu botãzinho de ligar e desligar emoções quando se trata de filmes, series e livros, mas cada noite não dormida por consequência disso vale a pena porque parece uma experiência expandida que nenhuma transmídia é capaz de me proporcionar. É uma reafirmação de sentimentos que vou levar comigo e momentos importantes para a minha formação.
Cada vez que retomo esses assuntos com alguém ou com os meus pensamentos percebo que é algo sem fim e se dependesse de mim ficaria horas só falando sobre estar com pessoas, sentir os seus sentimentos e do próximo e sobre como certas coisas são questão de tempo e perspectiva. Em um trecho da última temporada de Mozart in the Jungle dois personagens conversam sobre as diferenças entre ser regido por um maestro ou outro e tudo se resume a como aquele percebe o tempo e te transmite. São compassos e momentos que podem ser mais rápidos ou mais lentos. Música me parece muito complexa por causa disso mesmo, é um trabalho que lida diretamente com o moldar do tempo, mas a arte em geral pode fazer isso quando você percebe a diferença da leitura em narrativas que fluem ou que são mais pesadas.
Sendo assim o fruto amadurecer não é uma questão de ficar podre e cair de árvore, é desabrochar e saber que o tempo te trará milhões de sensações e que talvez cair seja uma delas, mas que você vai acabar seguindo em frente porque é a única opção.